sexta-feira, 5 de dezembro de 2008

O Bom Velho do Jardim

por Caio Azevedo

A Caravana do Selo UNICEF chega pela primeira vez à Bom Jardim. Foi preparada uma grande caminhada pelas ruas da cidade. Muitos ficam curiosos com o desfile de diversas bandas, formadas, sobretudo, por jovens. Um senhor bem idoso caminha lentamente com ajuda de uma bengala. Pára e fica observando a movimentação. Suas rugas, seu olhar calmo, sua bengala rústica, sua camisa listrada de botão e seu chapéu preto impõem um humilde respeito a quem o vê. Tem 92 anos, nasceu em Casinhas, morou em Surubim, em Orobó e se fixou em Bom Jardim há 48 anos. Pergunto a ele: “O senhor sabe o que tá acontecendo?”. “Não”, responde. “É a caravana do Selo UNICEF. Bom Jardim ganhou pela primeira vez”. “Tô sabendo agora. Isso é bom, né?”, comenta, com um riso. Tem 92 anos, nasceu em Casinhas, morou em Surubim, Orobó e se fixou em Bom Jardim há 48 anos. Sempre morou na mesma casa. “A cidade cresceu muito. Quando eu vim morar aqui, não tinha essa ponte, essas casas todas”. Hoje, Bom Jardim tem perto de 40 mil habitantes. "Nasci em 16 e nunca ninguém bateu na minha porta pra cobrar nada: 'o senhor está devendo tanto... nunca", fala com nobreza. "Aprendi com meu avô a não dever nada a ninguém".

As transformações das cidades estão sempre nas lembranças dos mais velhos. Fala das enchentes que existia quando não havia calçamento, da forma como as pessoas se vestiam, das brincadeiras, do trabalho, da família. “Tive treze filhos. Criei cinco. Num ano só, tive três filhos, dois gêmeos e uma menina. Morreram os três”. Mortalidade infantil é um problema que ainda atormenta Bom Jardim e o Estado: Pernambuco tem o segundo maior índice de mortalidade infantil do país. No entanto, os programas de Saúde da Família, de erradicação da mortalidade infantil surtem efeitos positivos. Já não há um abismo tão grande entre os verbos ter e criar. “Graças a Deus”, afirma o idoso, feliz porque, ao menos, seus cinco filhos criados estão bem de vida. Mora com uma delas, professora, os outros moram fora, mas sempre visitam quando podem.

Pergunto seu nome, ele pede a caneta e o papel. Diferente de hoje, frequentar uma escola não era para a maioria em sua época. “Eu estudei sim, mas sempre fui de trabalhar, até hoje nunca deixei”. Sempre na roça, com plantação e gado. Vender leite foi a principal forma de sustento. Mostra a mão esquerda com calos que parecem ter nascido nela. A outra mão escreve torto de forma certa:



Bom Jardim, Pernambuco, Brasil. 05 de dezembro de 2008.

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